História de Amarante e sua relação com os Doces Conventuais
A história
Amarante teve provavelmente a sua origem nos povos primitivos que habitaram a serra da Aboboreira (habitada desde a Idade da Pedra), embora se desconheça exatamente o nome dos seus fundadores. Contudo, só começou a adquirir importância e visibilidade após a chegada de São Gonçalo (1187-1259), nascido em Tagilde, Guimarães, que aqui se fixou depois de peregrinar por Roma e Jerusalém.
A este santo é atribuída a construção da velha ponte sobre o Rio Tâmega. Amarante torna-se alvo de peregrinações e a povoação foi crescendo.
Já no Século XVI, D. João III ordena a construção do Mosteiro de São Gonçalo sobre a capela junto à ponte sobre o Rio Tâmega, onde segundo a tradição São Gonçalo terá vivido e foi sepultado.
Em 1763, ocorre a derrocada da velha Ponte de São Gonçalo devido às cheias do Rio Tâmega. Nos anos seguintes foi reconstruída com o aspeto que ainda hoje apresenta.
No início do Século XIX, Napoleão Bonaparte tenta invadir Portugal e sobre Amarante passaram também estas invasões francesas, sendo palco do heroico episódio da defesa da Ponte de Amarante que valeu ao General Silveira o título de Conde de Amarante. A própria vila de Amarante teve a honra de ser agraciada com o colar da Ordem Militar da Torre e Espada que reflete no seu brasão municipal.
Após este episódio criam-se planos para a reconstrução da vila, pois os franceses tinham incendiado quase a totalidade das casas.
O Convento de Santa Clara, poderá ter sido construído no século XIII, embora não haja qualquer referência documental à sua instituição.
Conhece-se apenas uma carta de proteção dada por D. João I às clarissas em 1383, o que comprova que nesta data estava já plenamente estabelecido.
Foi Incendiado a 18 de abril de 1809, na sequência das invasões napoleónicas. Foi reconstruído e a partir de então, o antigo convento passou a designar-se Casa da Cerca.
Atualmente, o espaço da Casa da Cerca está adaptado a biblioteca e arquivo municipais de Amarante.
A capela da Casa da Cerca está classificada como Monumento de Interesse Público desde dezembro de 1974. Nela podem-se distinguir as quatro alas, o espaço do claustro onde se ergueu um chafariz e a igreja com torre sineira.
A situação geográfica de Amarante condicionou a sua gastronomia. Por um lado, Amarante está situada entre o Minho e Trás- os-Montes, tendo a sua comida características de ambas as províncias. Por outro lado, atravessava Amarante a estrada real entre o Porto e o interior Transmontano. Aí paravam, para retemperar forças, viajantes sujeitos a penosas viagens de liteira, diligência ou a cavalo “[…] Os ovos desempenham igualmente um papel importante na confeção da doçaria que vai bem com o vinho fino do Douro, produzido logo ali a sul. As gemas para os doces, as claras para a clarificação do vinho. A doçaria nasce conventual, mas as Invasões Francesas, obrigando à retirada das clarissas, precipitam a sua difusão pelas famílias da vila. Uma referência especial às pastelarias, que continuam a garantir a amarantinos e sobretudo a viajantes os deliciosos Papos-de-Anjo, Foguetes, Lérias e Brisas do Tâmega que rivalizam em fama (diz-se em Amarante) com o convento e a ponte” .
Doces conventuais
“A gastronomia é uma das atrações de Amarante. São famosos os doces conventuais feitos à base de ovos, nascidos da sabedoria culinária das antigas monjas Clarissas, ligadas ao Convento de Santa Clara. Papos de Anjo, Foguetes, Lérias e brisas do Tâmega são algumas das deliciosas especialidades açucaradas vendidas nas melhores pastelarias da cidade” .
Os doces das monjas Clarissas
Os Doces Conventuais de Amarante fazem parte do receituário de cozinheiras/os e doceiras/os com nome reconhecido nesta área.Ana Matias nasceu em 05-02-1844, casou em S. Gonçalo, às 7 horas da tarde do dia 22-04-1861, com dezassete anos dois meses e dezassete dias, com Manuel José Alves da Mota, nascido em 22-02-1827, com 34 anos e dois meses .
Tiveram sete filhos: Raquel, nascida em 18-05-1862; Artur, nascido em 24-07-1864; Maria (Mariquinhas), nascida em 24-03-1876; José, nascido em 01-05-1871; Laura, nascida em 13-03-1876; Albano, nascido em 29-02-1880; Custódia, nascida em 04-07-1882.
Supõe-se que a Ana Matias teria sido dama de companhia de uma Senhora que vivia no antigo Convento de Santa Clara que lhe ensinou as receitas dos doces conventuais das Clarissas – Lérias, cavacas, pão-de-ló, galhofas, SS, rosquilhos…, que transmitiu às filhas Maria, Laura e Custódia.
Mas o convento de Santa Clara, aquando da segunda invasão Francesa, em Abril de 1809, “ […] que ardeo de todo logo no primeiro dia que os Franceses entraraõ na villa […] tinha poucas freiras, as quais se tinhaõ retirado alguns dias antes do que elles entrassem no Porto; estaõ no de Monchique: obtivesse licença para a sua reedificação […]” .
Conclui-se que a Ana Matias tivesse obtido as receitas de alguém que vivesse na casa reedificada depois da invasão Francesa.
Marquinhas (Maria) a partir das receitas que lhe foram transmitidas, passou a fazer doces em casa que vendia na loja, no rés-do- chão, (hoje a Agência da E.D.P., na Rua 5 de Outubro). E tudo parece que esta terá explorado a Casa das Lérias, a que abaixo se faz referência.
A Custódia fazia doce na casa onde vivia e que mandava em latas para as feiras.
A Laura, ao casar com José Martins Branco, monta um estabelecimento de confeitaria e tabacaria, anterior ao ano de 1912.
Existe um documento que refere a existência de uma confeitaria fundada em 1845 com o nome de “Casa das Lérias, de Maria Alves da Motta, 12 – Rua Teixeira de Vasconcelos – 16”, no qual se acrescenta “Nesta casa, a mais antiga de Amarante, encontram-se à venda todas as qualidades de doce e em especial as afamadas Lérias de Amarante, cavacas, galhofas, SS, pão-de-ló, etc.”
E um outro documento, de 1909, refere a existência de uma confeitaria na Rua do Covêlo, (a das leandras?), onde hoje se situa o jardim Amadeu de Sousa Cardoso .
Em 1947, por ordem de antiguidade, havia em Amarante três confeitarias: Confeitaria da Ponte, (de Rodrigo Moreira Monteiro); Casa das Lérias, (de Alcino dos Reis) e Confeitaria Lai Lai.
Os Doces Conventuais de Amarante são bolos feitos à base de ovos, amêndoas e muito açúcar a partir de receitas originais oriundas do Convento de Santa Clara em Amarante.
Dependendo do formato, dos ingredientes e do acabamento os Doces Conventuais de Amarante incluem as Lérias, os Foguetes, os Papos de Anjo, os Bolos de S. Gonçalo e as Brisas do Tâmega.
Os Doces Conventuais de Amarante são feitos de forma artesanal, usando-se no seu fabrico como utensílio mecânico o ralador usado para ralar a amêndoa. Todos os outros ingredientes são batidos “à mão”.
A base dos bolos é praticamente igual, (ovos, amêndoas, açúcar e farinha), diferenciando-os a forma e os acabamentos.
No entanto temos exceções, como é o caso das Lérias onde não entram os ovos (somente confecionados com amêndoas com pele, farinha e açúcar).
Quanto aos acabamentos, os Papos de Anjo e os Foguetes são envolvidos em hóstia, o que lhes confere forma final característica. As Brisas do Tâmega têm forma de barquinho, devido à bolacha de baunilha onde o recheio de ovos é introduzido.
O importante e fundamental para um bom Doce Conventual de Amarante é a qualidade da matéria-prima.
LÉRIAS
As Lérias são um doce à base de farinha, açúcar, amêndoa e água, tradicional de Amarante. Apresentam forma de pequeno quadrado arredondado de cor escura. Historicamente a sua receita foi recuperada a partir de receitas das freiras do Convento de Santa Clara de Amarante, sendo servidas como sobremesa nos dias de festa e refeições mais importantes.
PAPOS DE ANJO
Os Papos de Anjo são doces tradicionais do concelho de Amarante, em forma de meia lua, com recheio de ovo e amêndoa, envoltos em folha de hóstia, finalizados com calda de açúcar e mistura de açúcares.
FOGUETES
Os Foguetes são doces conventuais tradicionais de Amarante, de forma cilíndrica, à base de ovo e amêndoa, envoltos em hóstia e cobertos com calda de açúcar.
S. GONÇALOS
Os S. Gonçalos são pequenos bolos de aspeto delicado e muito apelativo, de cor amarela viva devido aos ovos empregues na sua confeção.
BRISAS DO TÂMEGA
As Brisas do Tâmega caracterizam-se pela sua forma de barquinho, de bolacha de baunilha, que é recheado com a mesma massa que é utilizada para os papos de anjo. Em cima serão cobertos com um ponto de açúcar. De acordo com a Dona Ana Maria Carvalho da confeitaria Lai Lai, antigamente o recheio das Brisas do Tâmega seria colocado em pequenos “copinhos” de hóstia. Atualmente todos os produtores utilizam a bolacha de baunilha em forma de barquinho.